terça-feira, 18 de novembro de 2008

CoBrA


Domingo foi dia de visita ao CoBrA Museum em Amsterdam. CoBrA foi o grupo de artistas de vanguarda formado em 1948, reunindo pessoas de Copenhague, Bruxelas e Amsterdam. A sua consigna era clara: c'est notre désir qui fait la revolution [é o nosso desejo que faz a revolução]. Insatisfeitos com a esterilização e academização do surrealismo, queriam uma arte espontânea e livre, e, no limite, a transformação da vida em obra de arte.

Talvez um dos mais interessantes experimentalismos tenha sido a New Babylon de Constant Nieuwenhuis: a cidade utópica (no sentido concreto de Bloch), na qual não há exploração, todas as atividades não-criativas são automatizadas, e o Homo Faber é superado em direção ao Homo Ludens (conceito desenvolvido pelo também holandês Johan Huizinga). O esforço-jogo de Constant vai no sentido de pensar uma cidade no contexto de uma sociedade liberada:

Yet let us suppose that all nonproductive work can be completely automated; that productivity increases until the world no longer knows scarcity; that the land and the means of production are socialized and as a result global production rationalized; that, as a consequence of this, the minority ceases to exercise its power over the majority; let us suppose, in other words, that the Marxist kingdom of freedom is realizable. Were it to be, we could no longer ask the same question without instantly attempting to reply to it and to imagine, albeit in the most schematic manner, a social model in which the idea of freedom would become the real practice of freedom -- of a 'freedom' that for us is not the choice between many alternatives but the optimum development of the creative faculties of every human being; because there cannot be true freedom without creativity.

[Pois vamos supor que todo o trabalho não-produtivo possa ser completamente automatizado; que a produtividade aumente até que o mundo não mais conheça a escassez; que a terra e os meios de produção sejam socializados e como resultado a produção global seja racionalizada; que, como consequência disso, a minoria deixe de exerceu seu poder sobre a maioria; vamos supor, em outras palavras, que o reino da liberdade marxista seja realizável. Se o é, não podemos mais fazer a mesma questão sem imediatamente tentar respondê-la e imaginar, ainda que da maneira mais esquemática, um modelo social no qual a idéia da liberdade se tornaria a prática real da liberdade - de uma "liberdade" que para nós não é a escolha entre muitas alternativas, mas o desenvolvimento ótimo das faculdades criativas de todo ser humano; porque não pode haver verdadeira liberdade sem criatividade].

(As condições materiais, com as forças produtivias hiperdesenvolvidas do século XXI, já não estão prontas para a realização da utopia de Constant? Então, o que está faltando? A progressiva degradação das cidades não é resultado da contenção privada do potencial liberador da técnica avançada?).

CoBrA durou apenas três anos, mas sua influência foi muito além disso. Teve influência decisiva no movimento PROVO na Holanda. No final dos anos 50, alguns ex-integrantes (Asger Jorn, Constant) juntaram-se a outros radicais franceses para formar a Internacional Situacionista. Reunindo teoria marxiana, psicanálise, arte, estratégia e as melhores tradições dos comunistas de conselhos e anarquistas, este grupo foi responsável, talvez, pelos mais maravilhosos ataques ao capitalismo desde Marx, e foi o grupo mais consequente entre os insufladores do maio de 68 na França. Foram eles os redatores do texto Da miséria do meio estudantil, estopim dos acontecimentos em Nanterre.

Mesmo tendo como horizonte a superação das instituições dominantes, o CoBrA agora possui um museu oficial. Recuperados pelo poder? Tomara que não. A pior coisa que pode acontecer ao espírito CoBrA é a pasteurização esterilizante da moda.
O CoBrA Museum

Barricades (Constant)

Um vídeo com Karel Appel em ação:


Nenhum comentário: